A temática da Pluralidade Cultural diz respeito ao conhecimento e à
valorização das características étnicas e culturais dos
diferentes grupos sociais que convivem no território nacional, às
desigualdades socioeconômicas e à crítica às relações sociais
discriminatórias e excludentes que permeiam a sociedade brasileira,
oferecendo ao aluno a possibilidade de conhecer o Brasil como um país
complexo, multifacetado e algumas vezes paradoxal.
Este tema propõe uma concepção da sociedade brasileira que busca
explicitar a diversidade étnica e cultural que a compõe,
compreender suas relações, marcadas por desigualdades
socioeconômicas, e apontar transformações necessárias. Considerar
a diversidade não significa negar a existência de características
comuns, nem a possibilidade de constituirmos uma nação, ou mesmo a
existência de uma dimensão universal do ser humano.
Pluralidade Cultural quer dizer a afirmação da diversidade como
traço fundamental na construção de uma identidade nacional que se
põe e repõe permanentemente, e o fato de que a humanidade de todos
se manifesta em formas concretas e diversas de ser humano.
Por trabalhar com a diversidade humana, comporta uma ampliação de
horizontes para o professor e para o aluno, uma abertura para a
consciência de que a realidade em que vivem é apenas parte de um
mundo complexo, fascinante e desafiador, na qual o elemento universal
subjacente e definidor das relações intersociais e interpessoais
deve ser a Ética.
Propicia, ainda, a percepção de que essa característica
sociocultural é expressão de uma pluralidade dinâmica para além
das fronteiras do Brasil, a qual tem sido benéfica e estimuladora na
definição de valores universais.
Oferece, também, elementos para a compreensão de que respeitar e
valorizar as diferenças étnicas e culturais não significa aderir
aos valores do outro, mas, sim, respeitá-los como expressão da
diversidade, respeito que é, em si, devido a todo ser humano, por
sua dignidade intrínseca, sem qualquer discriminação.
É importante, ao tratar este assunto, fazer-se a distinção entre
diversidade cultural, a que o tema se refere, e desigualdade social.
As culturas são produzidas pelos grupos sociais ao longo das suas
histórias, na construção de suas formas de subsistência, na
organização da vida social e política, nas suas relações com o
meio e com outros grupos, na produção de conhecimentos, etc.
A diferença entre culturas é fruto da singularidade desses
processos em cada grupo social. A desigualdade social é uma
diferença de outra natureza: é produzida na relação de dominação
e exploração socioeconômica e política. Quando se propõe o
conhecimento e a valorização da pluralidade cultural brasileira não
se pretende deixar de lado essa questão.
Ao contrário, principalmente no que se refere à discriminação, é
impossível compreendê-la sem recorrer ao contexto social em que
acontece e à estrutura autoritária que marca a sociedade. As
produções culturais não ocorrem “fora” de relações de poder:
são constituídas e marcadas por ele, envolvendo um permanente
processo de reformulação e resistência.
Ambas, desigualdade social e discriminação, se articulam no que se
convencionou denominar “exclusão social”: impossibilidade de
acesso aos bens materiais e culturais produzidos pela sociedade, e de
participação na gestão coletiva do espaço público —
pressuposto da democracia. Por esse motivo, já se disse que, na
prática, o Brasil não é uma sociedade regida por direitos, mas por
privilégios.
Os privilégios, por sua vez, assentam-se em discriminações e
preconceitos de todo tipo: socioeconômico, étnico e cultural. Em
outras palavras, dominação, exploração e exclusão interagem; a
discriminação é resultado e instrumento desse complexo de
relações.
Entretanto, apesar da discriminação, da injustiça e do
preconceito, que contradizem os princípios da dignidade, do respeito
mútuo e da justiça, paradoxalmente o Brasil tem produzido também
experiências de convívio e da interetnicidade, a reelaboração das
culturas de origem, constituindo algo intangível que se tem chamado
de brasilidade, que permite a cada um reconhecer-se como brasileiro.
A pluralidade cultural existente no Brasil é fruto de um longo
processo histórico de interação entre aspectos políticos e
econômicos, no plano nacional e internacional. Esse processo
apresenta-se como uma construção cultural brasileira altamente
complexa, historicamente definida e redefinida continuamente em
termos nacionais, apresentando características regionais e locais.
Coexistem aqui culturas singulares, ligadas a identidades de origem
de diferentes grupos étnicos e culturais.
Essa composição cultural tem se caracterizado por plasticidade e
permeabilidade, incorporando em seu cotidiano a criação e recriação
das culturas de todos esses povos, sem diluí-las, ao mesmo tempo que
permite seu entrelaçamento. Nesse entrelaçamento de influências
recíprocas, configura-se a permanente elaboração e redefinição da
identidade nacional, em sua complexidade.
Convivem hoje no território nacional cerca de 206 etnias indígenas,
guardando, cada uma delas, identidade própria, representando, em si,
riquíssima diversidade sociocultural, além de uma imensa população
formada pelos descendentes dos povos africanos e um grupo igualmente
numeroso de imigrantes e descendentes de povos originários de
diferentes continentes, de diferentes tradições culturais e de
diferentes religiões.
A própria dificuldade de categorização dos grupos que vieram para
o Brasil, formando sua população, é indicativo da diversidade.
Mesmo para a elaboração de um simples rol, é difícil escolher ou
priorizar certo recorte, seja continental ou regional, nacional,
religioso, cultural, lingüístico, racial/étnico.
A diversidade marca a vida social brasileira. Encontram-se diferentes
características regionais, diferentes manifestações de cosmologias
que ordenam de maneiras diferenciadas a apreensão do mundo, formas
diversas de organização social nos diferentes grupos e regiões,
multiplicidade de modos de relação com a natureza, de vivência do
sagrado e de sua relação com o profano.
O campo e a cidade propiciam às suas populações vivências e
respostas culturais muito diferenciadas que implicam ritmos de vida,
ensinamentos de valores e formas de solidariedade distintas. Os
processos migratórios colocam em contato grupos sociais com
diferenças de fala, de costumes, de valores, de projetos de vida.
E. F. e o Tema Transversal Pluralidade Cultural
Desde sua introdução no país como ginástica e sua efetivação
como componente curricular, a Educação Física foi direcionada,
teorizada e utilizada de diversas formas. Em 1851 com a Reforma Couto
Ferraz, a Educação Física é introduzida oficialmente nas escolas
do município da corte e a partir de então passou por várias
mudanças de concepções devido às influências políticas e
sociais (Betti, 1991).
Assim, ao longo de sua história a E. F. foi utilizada para: melhorar
os hábitos higiênicos e consequentemente a saúde da população,
valorizando o desenvolvimento do físico e da moral a partir do
exercício; formar indivíduos capazes de defender a nação;
fortalecer o trabalhador para melhorar sua capacidade produtiva;
alienação política por meio dos esportes; gerar atletas de alto
nível para competições internacionais; propaganda nacional, pelo
êxito em tais competições; melhora da aptidão física; e
desenvolvimento psicomotor do aluno (BRASIL, 1998).
Em oposição a estes modelos biológicos e tecnicistas surgem várias
tendências que direcionam a Educação Física como componente
curricular, disciplina acadêmica e área profissional. Nas escolas
passou-se a discutir além de seus benefícios físicos, seu papel na
sociedade e na política, já que está incluída na teoria da
educação nacional que visa formar alunos críticos capazes de se
sentirem responsáveis pelo seu país.
Dentro deste contexto surgem os PCNs (BRASIL, 1997b) que propõem uma
prática educativa diferenciada, apresentando novas dimensões para o
trabalho da Educação Física na escola.
Segundo tais parâmetros, a Educação Física deve ser trabalhada
não somente em seus aspectos técnicos e fisiológicos, mas também
nas suas dimensões cultural, social, política e afetiva. Logo, esta
abordagem entende a Educação Física na perspectiva da cultura
corporal.
Tudo o que foi produzido corporalmente (danças, jogos, lutas,
ginásticas, capoeira e esportes) são “conhecimentos
historicamente e socialmente transmitidos” (BRASIL, 1997b, p. 23).
Propondo ao professor que desperte no aluno um novo olhar (crítico)
para a sociedade na qual está inserido, pois este nasce no contexto
de uma cultura, ajuda a produzi-la e a modificá-la, cumprindo assim
seu papel de cidadão.
Na visão de Daólio (2004, p.2), “a cultura é o principal
conceito para a educação física, porque todas as manifestações
corporais humanas são geradas na dinâmica cultural, desde os
primórdios da evolução até hoje, expressando-se
diversificadamente e com significados próprios no contexto de grupos
culturais específicos”.
Além deste, autores como João Batista Freire, Go Tani, Elenor Kunz,
Valter Bracht, Mauro Betti e o Coletivo de Autores discutem e
reconhecem a Educação Física como cultura, porém cada um se
fundamenta e parte de pressupostos diferentes. Deste modo,
atualmente, esta concepção cultural é relevante na Educação
Física, pois rompe com a visão restritamente biológica do corpo
agregando e considerando seus aspectos psicológicos, fisiológicos e
sociológicos.
Paulo Vicente - Personal Trainer